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sexta-feira, 10 de outubro de 2025

49A MOSTRA - The Crowd (2025), de Sahand Kabiri – Entre o silêncio e o ruído de uma geração


 

Em The Crowd, o cineasta iraniano Sahand Kabiri estreia com uma força impressionante ao transformar um enredo aparentemente simples — uma festa clandestina entre amigos — em um retrato intenso sobre culpa, repressão e desejo de liberdade. Exibido na Competição Novos Diretores do Festival de Roterdã, o filme reafirma o vigor do cinema iraniano contemporâneo, que há décadas encontra no cotidiano uma arena política e emocional.

A narrativa acompanha Hamed e Raman, dois jovens de origens distintas, dividindo um apartamento em Teerã. Enquanto Raman prepara sua emigração, Hamed, herdeiro de uma família conservadora, tenta ajudar o amigo a celebrar a despedida, organizando uma festa em segredo num galpão da família. A decisão desencadeia um conflito entre o prazer e o perigo — uma tensão típica de uma geração que vive sob constante vigilância.

Kabiri constrói seu filme a partir de gestos contidos e silêncios longos, confiando mais nas expressões dos personagens do que em diálogos explicativos. A fotografia de Hamed Hosseini Sangari traduz esse conflito interno com enquadramentos claustrofóbicos e uma paleta de cores frias, que só se abre durante a festa — momento em que a câmera, finalmente, respira. Essa breve explosão de luz e som é ao mesmo tempo libertadora e melancólica, pois sabemos que ela não pode durar.

O luto pela morte de Tondar, amigo próximo cuja tragédia precisa ser silenciada, funciona como espelho da própria condição do grupo: viver é, de certa forma, esconder-se. O som, cuidadosamente desenhado por Amirhossein Ghassemi, reforça essa ideia — o ruído distante da cidade, o eco dos passos no galpão, e o murmúrio coletivo da festa formam uma “multidão” que dá nome ao filme e ecoa o peso da repressão social.

Sem recorrer ao discurso direto, Kabiri entrega uma obra de rara sutileza, onde a política surge no não-dito, e a emoção brota do que não pode ser mostrado. The Crowd é um filme sobre juventude e resistência, sobre o direito de existir em meio ao controle — um grito abafado, mas impossível de ignorar.

Nota: 8,5/10
Um retrato poderoso de uma geração que encontra, na festa e no silêncio, sua forma mais pura de protesto.

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